Eu pouco sei de ti mas este crime
torna a morte ainda mais insuportável.
Era novembro,devia fazer frio,mas tu
já nem o ar sentias,o próprio sexo
que sempre fora fonte agora apunhalado.
Um poeta,mesmo solar como tu,na terra
é pouca coisa:uma navalha,o rumor
de abril podem matá-lo - amanhece,
os primeiros autocarros já passaram
as fábricas abrem os portões,os jornais
anunciam greves,repressão,dois mortos na
primeira
página,o sangue apodrece ou brilhará
ao sol,se o sol vier,no meio das ervas.
O assassino,esse seguirá dia após dia
a insultar o amargo coração da vida;
no tribunal insinuará que respondera apenas
a uma agressão (moral) com outra agressão,
como se alguém ignorasse,excepto claro
os meritíssimos juízes,que as putas desta espécie
confundem moral com o próprio cu.
O roubo chega e sobra excelentíssimos senhores
como móbil de um crime que os fascistas,
e não só os de Salô,não se importariam de
assinar.
Seja qual for a razão,e muitas há
que o Capital a Igreja e a Polícia
de mãos dadas estão sempre prontos a justificar,
Pier Paolo Pasolini está morto,
A farsa,a nojenta farsa,essa continua.
De Eugénio de Andrade(Novembro,75)
Um comentário:
Não é bem o Eugénio de Andrade que eu conhecia...
Gostei, claro.
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