Flamejante auriflama incendiada
patriótica face entumecida
com dentes de coroa cariada
e alma nacional - apodrecida.
Galões de oficial. Na face armada
um sorriso de arcanjo genocida
mais os comendadores da comendada
comandita que nos comanda a vida.
Olhar alarve mas não inocente
na mão aberta a palma democrata
na mão escondida a saudação fascista.
É fácil perceber que nem é gente
é um simples piolho que se cata
é um filho da puta é um bombista.
De Ary dos Santos
domingo, 31 de janeiro de 2010
domingo, 24 de janeiro de 2010
HARMONIA DO MUNDO
Canta no quintal do vizinho,o galo.
Tu e ele fazem parte da mesma harmonia,são irmãos nessa fome de viver. A vida tem uma só expressão,essa onde o galo canta,essa onde tu o escutas comovido,sabendo que a noite não o pode conter.
É este comércio subtil de lábios e fontes,este coral de sapos e ralos,que não pode morrer,mesmo que um dia o galo deixe de cantar,ou tu de o ouvir,meu querido Horácio.
De Eugénio de Andrade
sábado, 16 de janeiro de 2010
O MARTÍRIO
Flora nua vai subindo
por escadinhas de água.
O Cônsul pede a bandeja
para pôr os seios de Eulália.
Um jorro de veias verdes
brota de sua garganta.
Seu sexo treme enredado
como um pássaro nas silvas.
Sobre o chão,sem uma norma,
saltam suas mãos cortadas
que ainda se cruzam em ténue
oração decapitada.
Pelos buracos vermelhos
onde seus peitos estavam
vêem-se céus diminutos
e arroios de leite branco.
Mil arvorezinhas de sangue
cobrem as suas espáduas
e põem húmidos troncos
ante o bisturi das chamas.
Centuriões amarelos
de carne gris,desvelada,
chegam ao céu ressoando
as armaduras de prata.
E enquanto vibra confusa
paixão de crinas e espadas,
na bandeja o Cônsul leva
seios fumados de Eulália.
De Frederico Garcia Lorca
Tradução de José Bento
ed. Relógio d'Água
por escadinhas de água.
O Cônsul pede a bandeja
para pôr os seios de Eulália.
Um jorro de veias verdes
brota de sua garganta.
Seu sexo treme enredado
como um pássaro nas silvas.
Sobre o chão,sem uma norma,
saltam suas mãos cortadas
que ainda se cruzam em ténue
oração decapitada.
Pelos buracos vermelhos
onde seus peitos estavam
vêem-se céus diminutos
e arroios de leite branco.
Mil arvorezinhas de sangue
cobrem as suas espáduas
e põem húmidos troncos
ante o bisturi das chamas.
Centuriões amarelos
de carne gris,desvelada,
chegam ao céu ressoando
as armaduras de prata.
E enquanto vibra confusa
paixão de crinas e espadas,
na bandeja o Cônsul leva
seios fumados de Eulália.
De Frederico Garcia Lorca
Tradução de José Bento
ed. Relógio d'Água
quarta-feira, 6 de janeiro de 2010
DE UM PAI ANARCA
janeiro a seis
um dia de glória
chamam dia de reis
não é essa a história
é dia da mais nova princesa
de boa memória
quase raínha sua alteza
te adoro
a pé a cavalo ou de camelo
como és gosto que sejas
como sou gosto de sê-lo
um beijo do pai anarca
que por muito que tente
não tem vocação para monarca
um dia de glória
chamam dia de reis
não é essa a história
é dia da mais nova princesa
de boa memória
quase raínha sua alteza
te adoro
a pé a cavalo ou de camelo
como és gosto que sejas
como sou gosto de sê-lo
um beijo do pai anarca
que por muito que tente
não tem vocação para monarca
sábado, 2 de janeiro de 2010
O SALVAMENTO DO FILHO
Vejo o filho levado pela mosca
e estremeço de horror!
Tirado do berço pela mosca,
aprende,aos ziguezagues,a ser vítima da mosca,
mas não chora: um homem nunca chora.
A mosca agiganta-se,o filho diminui.
Um ruído de ventoínha invade o quarto.
Passa por mim a mosca,passa em tromba.
Vi com estes que a terra há-de comer
meu róseo filho que sorria!
Ó meu filho arrebatado que inocência a tua!
Essa fera peluda vai sugar-te
e tu sorris fininho,entre divertido e assustado,
como se a tripulasses num carrocel de feira!
E eu para aqui,tão caçador de moscas
numa infância tão aferroada,
sem um gesto,sequer uma palavra...
Mas de repente a mão disparo
no mesmo assomo de colegial
perseguidor de moscas (era nas aulas de moral...)
e enquanto na direita a mosca se interroga,
na concha da mão esquerda o filho cai - e chora!
De Alexandre O'Neill
e estremeço de horror!
Tirado do berço pela mosca,
aprende,aos ziguezagues,a ser vítima da mosca,
mas não chora: um homem nunca chora.
A mosca agiganta-se,o filho diminui.
Um ruído de ventoínha invade o quarto.
Passa por mim a mosca,passa em tromba.
Vi com estes que a terra há-de comer
meu róseo filho que sorria!
Ó meu filho arrebatado que inocência a tua!
Essa fera peluda vai sugar-te
e tu sorris fininho,entre divertido e assustado,
como se a tripulasses num carrocel de feira!
E eu para aqui,tão caçador de moscas
numa infância tão aferroada,
sem um gesto,sequer uma palavra...
Mas de repente a mão disparo
no mesmo assomo de colegial
perseguidor de moscas (era nas aulas de moral...)
e enquanto na direita a mosca se interroga,
na concha da mão esquerda o filho cai - e chora!
De Alexandre O'Neill
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