segunda-feira, 21 de março de 2011

DESDE A AURORA

Como um sol de polpa escura
para levar à boca,
eis as mãos:
procuram-te desde o chão,

entre os veios do sono
e da memória procuram-te:
à vertigem do ar
abrem as portas:

vai entrar o vento ou o violento
aroma duma candeia,
e subitamente a ferida
recomeça a sangrar:

é tempo de colher:a noite
iluminou-se bago a bago: vais surgir
para beber de um trago
como um grito contra o muro.

Sou eu,desde a aurora,
eu - a terra - que te procuro.

De Eugénio de Andrade