sábado, 1 de março de 2008

ELEGIA DE TIPASÁ


As armas - me perguntam - e desarmado

sentado em Tipasá pergunto ao mar:

em que verso em que tempo em que país

se venceu desarmado o ódio armado?

E o Tempo passa em Tipasá e diz:

que só por minhas mãos me posso armar.


E pena a pena passa o Tempo enquanto

passo a passo não passa esta saudade

não do que foi mas só do que será

- tempo futuro e arma do meu canto.

Que desarmado eu vi em Tipasá

armar-se de saudade a liberdade.


Porque vais a correr Tempo que passas

em Tipasá onde há Romas e Parmas

nestas pedras que são tempo passado?

E caem-me das mãos como de taças

as palavras que são amor mudado

em versos desarmados - minhas armas.


E passa o Tempo aqui onde não passa

a saudade que pena a pena passo.

Sobre as pedras passadas tempo novo:

Argélia onde foi França em cada praça.

Tempo que passas:quando é que meu povo

terá o seu tempo no seu próprio espaço?


E vai-se uma gaivota para o sul

Como o Tempo se vai como ele voa

como o Tempo seu voo é uma saudade.

E como o Tempo deixa um rastro azul

a gaivota que deixa sobre a tarde

em Tipasá um rastro de Lisboa.


E as armas - me perguntam.E desarmado

sentado em Tipasá pergunto ao mar.

E doem-me os minutos como farpas

cravados na canção que é já passado.

Abre-se o Tempo em mim com suas harpas

que poderei fazer se não cantar?


E o Tempo é uma canção do Rei de Tule.

Não peçam aos meus versos madrugadas

que não posso cantar como quereis

e já o Tempo mais que um rastro azul

deixou desertos nas palavras. Eis

minhas palavras nuas como espadas.


Eis estas armas que não são auroras

nem as pombas da paz que me pedis

- só palavras (sem armas) pelo ar. Mas

se vos servir o sangue destas horas

armai-vos do meu canto - que são armas

meus versos a sangrar por meu país.


De MANUEL ALEGRE

in O CANTO E AS ARMAS

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